terça-feira, 18 de outubro de 2011

Horário de Verão na Bahia - *Wagner, o relógio dos empresários e a constatação: Um governo anti-democrático

No último domingo (16 de outubro), a população das regiões Sudeste, Sul, Centro-Oeste e da Bahia adiantaram seus relógios em uma hora do horário legal, entraram no Horário de Verão.

Ele é adotado por iniciativa do Poder Executivo, com vistas a limitar a máxima carga a que o sistema elétrico fica sujeito, no período do ano de maior consumo, aumentando, assim, a confiabilidade do Sistema Interligado Nacional, constituído pelas linhas de transmissão e pelas usinas que atendem as regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e parte da região Norte. Adicionalmente, a adoção do Horário de Verão possibilita uma certa economia de energia ao País.

Apesar dessa aparente relevante motivação técnica, suas justificativas são insubsistentes ou, apesar de válidas, são insuficientes diante dos efeitos colaterais que o Horário de Verão tem sobre a vida das pessoas, em especial, à vida das pessoas que vivem no estado onde os índices de violência e criminalidade só avançam numa curva ascendente jamais vista na Bahia.

Nos estados do eixo sul, onde a jornada de trabalho exige do trabalhador um menor período de sono, por conta do tempo gasto com deslocamentos deficitários (mobilidade urbana), estes são obrigados a iniciar o gasto com energia de maneira mais robusta, logo ao acordarem, deslocando o pico de consumo para um horário mais cedo do que o desejável. Ou seja, a economia torna-se menor ainda, na perspectiva nacional.

O Estado da Bahia, por sua vez, que esteve fora do esquema de economia desde 2005 – sob decisão tomada após realização de estudos sobre a economia de energia, consulta a segmentos da sociedade baiana e realização de sondagem junto à população, segundo o que foi amplamente divulgado à época – volta a aderir, com alegações extremamente contraditórias para um governo que se auto-proclama republicano e democrático.

Em seu anúncio oficial[1], o chefe do executivo baiano declarou ter feito outro estudo que justificou o pedido documentado pelo "empresariado baiano" [2], e sem nenhuma consulta pública ou mesmo uma sondagem direta à população, decidiu unilateralmente pela adesão da Bahia ao Horário de Verão.

Secundarizando princípios basilares da gestão pública, estímulo à democracia e, sobretudo, à participação popular, desprezando o pensamento da maioria da população, o governador foi além e tentou justificar sua decisão afirmando que os baianos e baianas que reclamam a necessidade de acordarem mais cedo poderão compensar à noite. Entretanto, o ex-sindicalista Wagner, desconsidera aspectos culturais e biológicos dos trabalhadores em favor do apelo feito pelo empresariado, fundamentado pela caracterização da impossibilidade do relógio baiano estar fora dos ponteiros das regiões economicamente mais ativas, no bolo nacional.

Raciocínio cientificamente contestável, uma vez que é sabido que a qualidade do sono de uma população tem impactos imediatos, objetivos e concretos nos rendimentos produtivos. A mais singela alteração no ciclo do sono trás conseqüências dessas mudanças na saúde do trabalhador e no seu desempenho laboral, de tal maneira que o resultante é uma queda na produção final[3]. É fato, quem levanta com sono, almoça sem fome e dorme sem sono, tem uma única resposta do corpo: uma jornada sonolenta e fragilizada.

Não fosse pouca toda essa situação, tem o fator de exposição do trabalhador ao crescimento da violência no estado. E sobre isso, mesmo acreditando em medidas positivas à longo prazo, com a sistematização de um planejamento estratégico na área de segurança pública, a redução dos efeitos da criminalidade estão longe de acontecerem. Só em seu primeiro ano de governo (quando Wagner manteve a Bahia fora do Horário de Verão) o índice de homicídios tinha aumentado em 50% ao ano anterior, e é justamente por conta deste cenário que a manifestação negativa mais popular ganhou sustentação.

A importância deste aspecto foi materializada no documento elaborado pelo Sindicato dos Rodoviários[4], entidade filiada à CUT que, apesar de não ter feito uma luta mais consistente sobre esse processo, apresentou dados que reafirmam a argumentação trazida aqui.

Como alternativa ao horário de verão como vetor de economia, o Poder Executivo deveria lançar mão por uma ampla campanha que envolvesse a população de maneira mais direta na economia de energia, levantando didaticamente os ganhos que essa campanha poderia trazer à população de conjunto, exemplificando, através do que foi o apagão já vivenciado pelos baianos e baianas, o significado de um esforço coletivo.

Ademais, é urgente o debate sobre os modais de captação e distribuição de energia. Neste sentido, a Bahia, através de seu potencial natural e com mais tempo de luz solar, pode iniciar a transformação da forma de desenvolvimento em seu território. É o momento de ser pensado um desenvolvimento sustentável numa plataforma equilibrada e de baixos impactos como a energia solar e eólica, a Bahia tem campo para isso, basta vontade política.

Vontade essa que esta confrontada. Já que os poderes executivos (estado-união) estão em um patamar de relação com mais proximidade por, efetivamente, estarem sob um mesmo projeto. Não é possível aceitar que o horário de verão seja a pauta de pertencimento da Bahia ao restante deste projeto. Equivocam-se então quem, mesmo com este pensamento, ainda tenta construir uma identidade republicana ou minimamente federalizada.

A Bahia precisa pensar este conjunto de elementos e, na medida em que configurada sua viabilidade, cobrar democraticamente o respeito ao desejo popular.

 

*Ícaro Argolo é advogado e especializando em Gestão Pública pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB)



[1]              Disponível em: http://tinyurl.com/3s9799e

[2]              Disponível em: http://tinyurl.com/3l7q29b

[3]              Disponível em: http://www.medicina.ufmg.br/rmmg/index.php/rmmg/article/viewFile/229/212

[4]              Disponível em: http://tinyurl.com/3chx4oj  


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